"Saborear a paz com o mundo.
A paz com os homens.
E no entanto, travar guerras comigo na espuma dos dias, tantas vezes, na ronda das noites...
Armadilhar os instantes, mesmo os mais improváveis, no desejo impossível de roubar as asas às aves, de mergulhar fundo nos abismos, de ver de olhos fechados aquilo que não pode perder o brilho... Lançar mísseis terra-ar, rebentar bombas e espoletar granadas, cavar trincheiras para encurralar as emoções.
Sabotar a desesperança.
Armadilhar a memória - sou Guerrilheira de mim, sniper de elite na precisão dos tiros, nos disparos que implodem as sombras, que despedaçam os fantasmas...
Queimar-me. Ferir-me. Sangrar.
Convocar todas as forças em ataques aéreos às janelas do olhar; atear fogo de chão no rasto dos meus passos.
Incendiar cheiros e cores e músicas e palavras... Fazer puro terrorismo à infinita saudade...
É uma guerra sem aliados nem alianças, sem tratados de paz nem acordos de cessar-fogo.
E depois, afinal, refugiar-me no bunker do coração, lamber feridas, curar as chagas no sal das marés. Trair o tempo.
Iludir as sentinelas da razão.
Depor todas as armas, rir das ironias do destino, continuar a querer os impossíveis, abrir as asas para voar mais longe...
Tropeçar de ternura... Quem sabe, ir morrendo aos poucos, de excesso de paixão...
Render-me sem mágoa aos efeitos colaterais: a lágrima traidora, vigia teimosa e transparente aos outros, a encher de brilho a lonjura do olhar; talvez um bater mais forte do coração.
Em paz com o mundo.
Em paz com os homens.
Debaixo da pele, todas as guerras são só minhas."
(Anna M.)
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